Maria Stella de Azevedo Santos
Todo início de ano, que é entendido pela população como início de um novo ciclo, instiga as pessoas a consultarem oráculos. São muitas as artes divinatórias, todas elas baseadas em um completo, minucioso e complexo sistema filosófico. Aliás, só pode ser considerado verdadeiramente um oráculo o sistema divinatório que possua um código de interpretação simbólica, e até mesmo matemática. Não basta apenas ser uma pessoa intuitiva para que esta se coloque em posição de ler oráculos, é preciso que esteja inteiramente vinculada a uma tradição religiosa ou filosófica e conheça realmente seus fundamentos.
Apesar de diferentes tipos de materiais poderem ser usados para que se estabeleça uma conexão com o divino, é imprescindível um grande conhecimento da padronização do código do sistema divinatório em que o objeto está inserido. Assim são utilizados baralhos, pedras, varetas, e no caso da cultura africana vários tipos de sementes, além do objeto mais conhecido no Brasil que são os búzios.
Faço sempre a opção de falar em sistema divinatório e não adivinhatório, pois a utilização de um oráculo é uma oração realizada com o intuito de receber respostas reveladas pelas divindades, sejam elas as divindades maiores ou a divindade pessoal de cada um que busca esclarecimentos para suas dúvidas e orientações para seus atos futuros.
O jogo de búzios não adivinha o futuro, mostra o caminho presente, levando o consulente a refletir sobre as melhores atitudes a serem tomadas para que a caminhada a seguir seja mais fácil. Afinal, o milionésimo de segundo após o presente já é futuro. O que me inspirou a escrever sobre esse tema foi um simpático e-mail que recebi e que, depois de ter obtido a devida autorização, transcrevo-o na íntegra para meus leitores:
“Prezada Mâe Stella, permita-me inicialmente saudá-la com respeito e reverência. Sou seu leitor assíduo na segunda página do jornal A TARDE. Admiro muito os seus posicionamentos e as suas reflexões que muito têm me ensinado. Sou cristão e católico, assim fui batizado, porém interesso-me por todas as religiões, leio sobre as mesmas e as respeito. ‘Muitos são os caminhos que levem à casa de Deus’. A senhora realmente acredita que se possa saber o futuro através dos búzios? Continue escrevendo e me ensinando. Vida longa e próspera. Respeitosamente. Benigno Alves dos Santos Bruno Bacelar”.
O certo é o incerto. A certeza da vida está na dúvida. Quando procuramos entender, compreender a realidade, ela se transforma em torno de si mesma para gerar novo questionamento. E o futuro a Deus pertence. O futuro é o mistério que pertence ao maior de todos os mistérios – Deus. Espero ter respondido à pergunta do amigo Benigno, que como o próprio nome diz é uma pessoa do bem, assim como é do bem e para o bem devem ser utilizados os oráculos.
O hábito de se vestir de branco no primeiro dia do ano demonstra, de maneira talvez inconsciente, o desejo que têm as pessoas de praticarem o bem, afinal a cor branca é considerada a mais generosa de todas as cores do espectro, uma vez que, de acordo com o conceito de cor-energia, branca é a cor da luz, pois recebe todas as cores, mas não fica com nenhuma para si, reflete todas, iluminando assim o ambiente e a pessoa que a está usando. Branca é a cor de oxalá, considerado o mais puro dos orixás.
Este artigo será lido exatamente no dia em que se inicia um novo ano – 2014 –, momento em que muitos perguntam qual o odu (caminho) e o orixá que estará governando. Não me canso de repetir que quando a divinação é feita para uma coletividade, como é o caso do “jogo do ano” realizado pelos terreiros de candomblé, as respostas reveladas e interpretadas só são direcionadas às pessoas vinculadas àquela “casa de culto”.
Por exemplo: as orientações dadas pelo caminho e pelo orixá que se apresentar no jogo de búzios feito por mim, mãe Stella de Oxossi, são dirigidas às pessoas que, de uma maneira ou de outra, por religiosidade ou afeto, têm um vínculo espiritual com o Ilê Axé Opô Afonjá. Quem muito se mistura não consegue se encontrar.
Maria Stella de Azevedo Santos escreve, quinzenalmente, às quartas-feiras no jornal A TARDE